Kanban: Organização e Produtividade com o Professor Leonardo Campos

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Foto: Reprodução

Professor Leonardo Campos: com o excesso de informação do contemporâneo, em suas aulas, você constantemente traz métodos de organização, sugestões de leitura para ampliar a reflexão crítica dos envolvidos. Hoje, o tema é organizar para ser produtivo. Pode parecer óbvio de tanto que se fala nisso, mas explica para os nossos leitores a importância da organização em projetos pessoais e profissionais?

Nós todos estamos num invólucro de demandas sempre muito agitadas. Quando digo isso, contemplo as gerações mais antigas e as atuais. Quantas vezes nos pegamos chegando em casa da rua, depois de um dia exaustivo, e já conectando o computador para mais uma jornada, mesmo já tendo visualizado e respondido mensagens pelo WhatsApp gerando demandas que parecem intermináveis? É a dinâmica do contemporâneo, necessária, mas muitas vezes promovedora de adoecimentos. Por isso, precisamos organizar muito bem os nossos processos. Adentrar na produtividade, mas conduzir todo esse volume de atividades com precisão. Hierarquizar o que é mais urgente, delegar tarefas, dentre outros tópicos que falamos noutro momento por aqui quando dialogamos sobre Gestão do Tempo. No caso da organização, ter uma gestão visual das atividades é algo que funciona muito comigo e também é comprovado com base em pesquisas e testagens. Uso de post-it para traçar um panorama do que tem que ser feito, delineando as suas etapas, pode ser numa planilha do Excel, numa agenda impressa ou digital, num mural tradicional, em suma, vislumbrar visualmente as etapas de suas demandas é uma opção saudável para melhor gestar processos e projetos, pessoais e profissionais. Sem organização espacial do ambiente de trabalho, sem pastas para inserção de cada tópico temático diferente e sem refletir melhor sobre nosso relacionamento com a tecnologia e seus desdobramentos, isto é, aplicativos, redes sociais e afins, o caminho do caos se pavimenta, causando desconforto e sensação de improdutividade.

Durante a sua fala, você trouxe o uso do Kanban como ferramenta. Do que se trata exatamente?

O Kanban é um sistema de gestão visual de projetos. É algo que promove a melhora da equipe de forma contínua, tendo em vista adequações das demandas diante de um projeto. De forma incremental, as mudanças devem focar na melhoria do processo já existente. É um recurso que ajuda na entrega de produtos com maior qualidade, diminui as margens de erro, bem como o retrabalho, melhora a previsibilidade das entregas, simplifica o que precisa ser priorizado e melhora a satisfação de todos os envolvidos num projeto. A lei básica do Kanban é “pare de começar e comece a terminar”. É a diminuição das listas volumosas do que está em andamento e fugir do mito da multitarefa como algo bom para a produtividade. Parte dos esquemas que envolvem as metodologias ágeis, o Kanban possui um quadro, dividido em To Do (para fazer), In Progress (fazendo), Testing (Testando) e Done (Pronto). Importante ressaltar que ter apenas o quadro não é praticar o recurso. Se você não seguir os parâmetros e ajustar as informações para diminuir os gargalos possíveis de um projeto, estará usando apenas o quadro Kanban, não o princípio em si. O Kanban tem como meta tornar os processos mais enxutos, previsíveis, simplificados e reduzir as taxas comuns de desperdício de tempo, esforço e recursos materiais.

Mas como saber então se a equipe está utilizando somente o quadro e não os princípios?

Você pode usar uma planilha Excel, um mural impresso, um quadro Kanban comprado na internet ou loja especializada, ou então, a plataforma virtual Trello. Faça uma reunião com os envolvidos para que todos entendam a ferramenta. Na organização do quadro, defina os critérios que cada tarefa irá atender para ser considerada como concluída. O Kanban trabalha da esquerda para direita. Para passar do lado esquerdo para o direito, a ação delineada precisa ter avançado, como no quadro que disponibilizei para você ilustrar essa minha fala. Distribua sempre em cores, para que a gestão visual seja mais clara para os envolvidos e cada um compreenda que uma determinada cor significa que suas definições de tarefas foram devidamente concluídas. Dentro de cada coluna, lembre-se de priorizar o que for mais urgente no topo, criando hierarquias. É muito importante saber priorizar e classificar cada atividade. É fundamental que se limite o trabalho em andamento. Um dos objetivos do método é controle do trabalho em desenvolvimento, tendo em vista garantir um máximo fluxo de um único item do início ao fim. Assim, diminui a necessidade de tantas reuniões, minimiza a multitarefa e permite que o produto desenvolvido, que pode ser um conteúdo para comercializar, um projeto pessoal ou até mesmo um trabalho da faculdade seja executado a tempo de venda, entrega e apresentação.

Entender a história do Kanban talvez permita que os leitores compreendam ainda melhor a sua aplicabilidade. Explica as bases deste recurso aparentemente simples, mas que parece complexo à primeira vista?

O desenvolvimento do método em questão se baseia numa produção puxada, em linhas gerais, a produção de um novo produto se inicia somente quando a anterior já foi executada. Desta maneira, murais bem visíveis na linha de produção dos envolvidos são instalados, com uso de cartões de várias cores, cada uma para definir as ações já concluídas, as que estão em processo e as que ainda serão inicializadas. O Kanban tem suas raízes na Toyota, fábrica de automóveis japonesa que se viu em crise nos anos 1940 com excesso de produção sem saída de seus estoques. O idealizador estabeleceu que precisavaexecutar processos para evitar que houvesse produtos excedentes, mas que também não faltasse oferta no mercado. Em geral, equilibrar a sua linha de produção. Atualmente, o Kanban tem sido utilizado muito além do sistema industrial e de grandes empresas do mercado, mas é parte também de prestadores de serviços, desenvolvedores de softwares, dentre outros. Em nossos trabalhos estudantis, eu mesmo, quando estou diante de um projeto de pesquisa ou desenvolvimento de um novo livro sobre uma das minhas áreas de atuação, aplico o Kanban para otimizar a jornada. Há, nesta possibilidade, duas modalidades: o de produção e o de movimentação. Na perspectiva de produção, os murais ficam disponíveis para todos os colabores responsáveis pela execução de tarefas naquela fase de produção. To Do (tarefas a serem feitas), Doing (tarefas em execução) e Done (tarefas concluídas). Menciono aqui os termos em inglês porque muitos softwares, murais prontos e livros trazem estas denominações estrangeiras, mas podemos, e devemos, adaptar para a nossa língua. O Kanban de movimentação, utilizamos para comunicar os setores de produção o momento ideal de uma tarefa, ou então, quando devemos dar o comando para o inicio de uma nova fase dentro de uma cadeia produtiva. Parece complexo, mas depois da primeira empreitada com a proposta, os processos fluem e todos os envolvidos entendem muito bem.

Em nosso podcast sobre Gestão do Tempo, você falou bastante sobre a ideia errada que as pessoas têm acerca da produtividade. Considera que há muita confusão entre produzir e ser produtivo?

No âmbito em que estamos dialogando por aqui, a produtividade deve ser pensada com a relação da nossa capacidade de produzir algo e o tempo de execução desta demanda. Vamos para um exemplo: num dia de sábado, pela tarde, enquanto seu colega conseguiu assistir dois aos documentários sobre um determinado assunto em comum debatido numa aula, você conseguiu apenas ver 20 minutos de uma das produções. Isso significa que a produtividade dele foi maior que a sua. E, para se perguntar, quais foram os fatores: interrupções por chamadas no smartphone? Dispersão dentro de casa? Falta de foco. A produtividade não é algo imaginário, mas mensurável em nosso cotidiano, pois se relaciona com o máximo de atividades que você consegue desenvolver utilizando menos tempo e recursos. E, no caso deste exemplo, não são recursos materiais, financeiros, mas do seu próprio tempo e energia intelectual. Pessoas mais produtivas conseguem ter maior capacidade na resolução de problemas, tem iniciativa, organização, proatividade, comprometimento com resultados, atuar com colaboração, apresentar consistência em suas atividades, além de desenvolver facilidade no aprendizado, praticidade e objetividade, dentre outras coisas. Para aqueles que pretendem se denominar produtivos, a gestão visual de suas demandas é um recurso fundamental para alcançar sucesso em suas atividades. Com organização, mapeamos a caminhada e gerenciamos melhor tudo.

Outro ponto que achei bastante engraçado foi você se definir como o “louco do post-it”. Acha este recurso, custoso por sinal, realmente prático?  

O post-it acaba não sendo tão acessível pelo valor. É um fato. Mas é só fazer uma adaptação. Nesta imagem que compartilhei contigo, por exemplo, sigo um padrão quase semelhante. Cada missão é pintada, na bolinha, conforme executo o combinado. Isso pode ser feito na agenda do smartphone, numa planilha do Excel, há várias modalidades. Cada um funciona de um jeito. Eu, em especial, preciso da gestão visual. Sento, organizo o que tem que ser feito e coloco diante de mim, neste mural. Vejo diariamente o que está pronto, o que declinou da proposta e não será mais realizado, aquilo que precisa de mais urgência e o que precisa ser feito com mais tempo. Passa uma sensação de trabalho cumprido, de produtividade e de organização. Reclamamos muito de falta de tempo, o que é um fato, haja vista as tantas atribuições contemporâneas, mas se a gente optar por organizar melhor as tarefas, talvez essa sensação não seja tão angustiante. E, sim, sobre o post-it ou qualquer adaptação que você faça com o recurso, brinco em ser o “louco” porque pode parecer uma obsessão, mas não é. É uma maneira de reduzir a ansiedade diante das minhas atribuições. Individual ou coletivamente, o post-it permite é de fácil compreensão por todos que participam da comunicação direta de um projeto. Fixado num lugar de acesso aos demais, todos podem ver o desenvolvimento das atividades. O post-it estimula cenários de testes, informações novas podem ser afixadas para conhecimento de todos, bem como as etapas de uma produção também. Nesta organização, o post-it pode criar uma gestão visual que melhore o engajamento pessoal e coletivo. Algumas pessoas utilizam na agenda, outros colam do lado da tela de seu computador. Este produto que se transformou em um substantivo é muito eficiente e se usado adequadamente, pode ser um divisor na organização das atividades cotidianas de um indivíduo em suas dinâmicas pessoais e coletivas.

De volta ao Kanban: para ilustrar melhor para os nossos leitores, demonstram exemplos práticos do uso desta ferramenta em suas aulas?

Demonstrei para os estudantes por meio de um projeto na disciplina Planejamento de Carreiras. É do curso de Administração, geralmente do primeiro semestre, mas estudantes de outras áreas podem cursar como optativa. Além das aulas expositivas, textos, realização de exercícios, os envolvidos produzem, juntamente comigo, uma temporada de podcasts por semestre. O tema é Planejamento de Carreiras em Perspectiva. Cada equipe de trabalho analisa um filme e, depois de debaterem entre si, produzem áudios entre um minuto e dois e enviam para mim. O jornalista Ronaldo Anunciação faz a narração, eu inicio com alguns pontos da narrativa e, no desfecho, anexamos as contribuições dos estudantes. Assim, as aulas ficam mais participativas, eles ainda recebem um certificado pela ação, o que aumenta as suas hardskills e, no processo de debate, produção e esquematização do podcast, as softskills. Trazendo para o Kanban, montei um quadro ilustrativo com as demandas para realização do podcast. Dividido em o que é para fazer, o que está sendo feito e o que já está pronto. Cada etapa com um post-it de uma cor e organizado de cima para baixo por urgência. É uma das tantas possibilidades do Kanban como ilustração para o estudante, uma maneira de compreender a prática sem ficar apenas observando exemplos de empresas famosas ou as ilustrações que os livros trazem, muitas vezes de casos internacionais, necessários para compreensão, mas não tão próximos da realidade dos estudantes. Se a pessoa entender por meio deste exemplo, aplica com qualquer outro projeto.

Para o encerramento do nosso papo rápido, expõe para os nossos leitores outras dicas para uso do Kanban em projetos e situações de produtividade?

Nas aulas eu geralmente verso sobre campanhas de marketing, gerenciamento de redes sociais, controle financeiro, além do exemplo prático que apresentei com a disciplina Planejamento de Carreiras, ministrada no curso de Administração da instituição que estou vinculado atualmente. Nas demandas de uma campanha de marketing, a aplicação do Kanban pode ajudar a simplificar o processo, mas a equipe toda deve ter ciência da prática deste recurso, para que haja entendimento coletivo e as coisas fluam de maneira orgânica. Por meio do quadro, o responsável pela campanha tem a possibilidade de direcionar as atividades e tarefas que necessitam de execução, distribuindo concomitantemente as responsabilidades de cada um. Ao passo que as etapas são cumpridas, o quadro vai se reformulando e o acompanhamento se torna mais eficiente. Há mais motivação nas atividades, sabe? Perceber visualmente o andamento das coisas. Para as redes sociais, não é diferente. Estar nas plataformas virtuais é um requisito de qualquer empreendimento atual. Por meio de cores, o responsável pelo projeto pode controlar situações, saber o que já foi cumprido e o que está em andamento, organizar as tarefas dos envolvidos, tais como responder post, postar algo novo, checar direct, verificar demandas, etc. No ambiente físico ou virtual de um projeto, os envolvidos podem também controlar as questões financeiras de um empreendimento. Distribuir tarefas, contas a pagar, verificar a comunicação com clientes inadimplentes, confirmar pagamentos, observar fluxo de caixa de um projeto. São muitas as possibilidades. Aqui apenas delineio alguns caminhos.